quarta-feira, 16 de março de 2011

Alíquotas contínuas para o Imposto de Renda

A tabela do Imposto de Renda é uma criatura estranha. Em nome da curiosidade matemática, bem que a Receita Federal poderia esclarecer os cálculos que amparam os números.

A tabela abaixo mostra as bases, as alíquotas e as diferenças entre as faixas.

Base (R$)Diferença para
base anterior (R$)
Alíquota (%)Diferença para
alíquota anterior (%)
0
0
0
0
1.499,15
1.499,15
7,5
7,5
2.246,75
747,60
15
7,5
2.995,70
748,95
22,5
7,5
3.743,19
747,49
27,5
5

Então, exceto pela  diferença entre as bases primeira e zerésima, há uma diferença de cerca de R$750 entre elas. E exceto pelas última e pela penúltima alíquotas, há uma diferença de 7,5% entre elas.

A regressão linear mostra que a reta que melhor descreve o crescimento das alíquotas é a de inclinação 0,007 (a cada real, a alíquota cresce 0,007%). Para o primeiro real da última base, por exemplo, essa reta produziria uma alíquota de 26,20% (3743,19*0,007).

O gráfico mostra as alíquotas e a tendência delas (em preto). Porque a escala não é igual nos dois eixos, a linha preta parece muito mais inclinada do que de fato é (eis uma preciosa lição sobre como mentir com gráficos).



O problema de usar essa reta, evidentemente, é que as pessoas pagariam mais impostos e não haveria faixa de isenção. Mas é possível usar a reta a partir de um valor máximo de isenção e até um limite razovável de alíquota. Sem uma alíquota máxima, as pessoas começariam a pagar mais de 100% sobre os valores acima de R$14.285,71.

E como seria calculado esse imposto? Com triângulos, claro!

Ganhando x, calcula-se o imposto assim:

(x2*0,00007)/2.

Considerando uma faixa de isenção f, o cálculo seria:

 (x2*0,00007)/2-(f2*0,00007)/2 ou [(x2-f2)*0,00007]/2.

Um valor hipotético de R$4.000,00 seria tributado em R$407,22 pelas alíquotas normais e em R$486,50 pela alíquota contínua. O valor é maior, porque enquanto as alíquotas permanecem estáveis entre bases no cálculo normal, com a alíquota contínua ela é sempre um pouco maior para cada real adicional (ou mesmo a cada centavo).

Com uma alíquota máxima, o cálculo seria um pouco mais complicado. Se a alíquota máxima for fixada em 40%, o primeiro valor a atingi-la será R$5.714,28 (chamarei isso de M). Então, quem ganhar um salário S acima disso, pagará:

[(M2-f2)*0,00007]/2 + (S-M)*0,40

A primeira parte é constante e podemos reduzir a conta a uma expressão mais simples:

R$1.069,35 + (S - R$5.714,28)*0,40

Para um valor hipotético de R$10.000,00, o imposto seria de R$2.783,64 e, como esperado, um tanto maior que os R$2.057,22 do cálculo normal (se limitássemos a alíquota em 27,5%, então o imposto devido seria de R$2.149,71 e muito mais próximo ao cálculo normal).

Adotando uma alíquota contínua, seria preciso reduzir o ângulo de ataque, já que o próprio fato de ser contínua compensaria as alíquotas menores nos salários mais baixos. Além disso, se há justiça no fato das alíquotas serem progressivas (eu acho que sim, mas isso é tema para outro debate!), uma alíquota contínua seria ainda mais justa.

Claro, alguém pode achar que uma alíquota logarítma seria ainda mais justa, mas isso merece seu próprio artigo!

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