A tabela do Imposto de Renda é uma criatura estranha. Em nome da curiosidade matemática, bem que a Receita Federal poderia esclarecer os cálculos que amparam os números.
A tabela abaixo mostra as bases, as alíquotas e as diferenças entre as faixas.
Base (R$) | Diferença para
base anterior (R$) | Alíquota (%) | Diferença para
alíquota anterior (%) |
0 | 0 | 0 | 0 |
1.499,15 | 1.499,15 | 7,5 | 7,5 |
2.246,75 | 747,60 | 15 | 7,5 |
2.995,70 | 748,95 | 22,5 | 7,5 |
3.743,19 | 747,49 | 27,5 | 5 |
Então, exceto pela diferença entre as bases primeira e zerésima, há uma diferença de cerca de R$750 entre elas. E exceto pelas última e pela penúltima alíquotas, há uma diferença de 7,5% entre elas.
A
regressão linear mostra que a reta que melhor descreve o crescimento das alíquotas é a de inclinação 0,007 (a cada real, a alíquota cresce 0,007%). Para o primeiro real da última base, por exemplo, essa reta produziria uma alíquota de 26,20% (3743,19*0,007).
O gráfico mostra as alíquotas e a tendência delas (em preto). Porque a escala não é igual nos dois eixos, a linha preta parece muito mais inclinada do que de fato é (eis uma preciosa lição sobre como mentir com gráficos).
O problema de usar essa reta, evidentemente, é que as pessoas pagariam mais impostos e não haveria faixa de isenção. Mas é possível usar a reta a partir de um valor máximo de isenção e até um limite razovável de alíquota. Sem uma alíquota máxima, as pessoas começariam a pagar mais de 100% sobre os valores acima de R$14.285,71.
E como seria calculado esse imposto? Com triângulos, claro!
Ganhando
x, calcula-se o imposto assim:
(x2*0,00007)/2.
Considerando uma faixa de isenção
f, o cálculo seria:
(x2*0,00007)/2-(f2*0,00007)/2 ou [(x2-f2)*0,00007]/2.
Um valor hipotético de R$4.000,00 seria tributado em R$407,22 pelas alíquotas normais e em R$486,50 pela alíquota contínua. O valor é maior, porque enquanto as alíquotas permanecem estáveis entre bases no cálculo normal, com a alíquota contínua ela é sempre um pouco maior para cada real adicional (ou mesmo a cada centavo).
Com uma alíquota máxima, o cálculo seria um pouco mais complicado. Se a alíquota máxima for fixada em 40%, o primeiro valor a atingi-la será R$5.714,28 (chamarei isso de M). Então, quem ganhar um salário S acima disso, pagará:
[(M2-f2)*0,00007]/2 + (S-M)*0,40
A primeira parte é constante e podemos reduzir a conta a uma expressão mais simples:
R$1.069,35 + (S - R$5.714,28)*0,40
Para um valor hipotético de R$10.000,00, o imposto seria de R$2.783,64 e, como esperado, um tanto maior que os R$2.057,22 do cálculo normal (se limitássemos a alíquota em 27,5%, então o imposto devido seria de R$2.149,71 e muito mais próximo ao cálculo normal).
Adotando uma alíquota contínua, seria preciso reduzir o ângulo de ataque, já que o próprio fato de ser contínua compensaria as alíquotas menores nos salários mais baixos. Além disso, se há justiça no fato das alíquotas serem progressivas (eu acho que sim, mas isso é tema para outro debate!), uma alíquota contínua seria ainda mais justa.
Claro, alguém pode achar que uma alíquota logarítma seria ainda mais justa, mas isso merece seu próprio artigo!