O novo filme de Wim Wenders me agradou por alguns motivos distintos.
Em primeiro lugar, as cidades japonesas me atraem por toda a infraestrutura que oferecem. Tenho a impressão de que deve ser possível morar dentro de uma loja de conveniência japonesa (recomendo o livro Uma Questão de Conveniência de Sayaka Murata). Algumas pessoas são atraídas pelas tradições japonesas, eu curto mais são as modernidades.
Em segundo lugar, os banheiros. Eles foram projetados por grandes arquitetos e demonstram que a infraestrutura das cidades também pode ser interessante. E que, sendo interessante, a cidade fica mais rica.
Em último lugar, a ideia do filme.
Algumas empresas japonesas fabricam produtos que considero melhores por serem mais conservadores. Em especial, os carros da Toyota e as impressoras Brother têm menos novidades supérfluas e são bastante confiáveis. A confiabilidade é o que me interessa.
O consumismo ocidental é confundido com materialismo, mas a busca por novidades e marcas não é materialismo. Certos objetos eu desejo pela função apenas; a marca, a cor, ou os acessórios não são importantes.
Os carros Kei nunca seriam aceitos no Brasil (eu adoraria ter um para andar na cidade). As pessoas buscam atributos irrelevantes para a utilidade do carro: querem se sentir mais ricas, ou mais másculas, ou mais poderosas. O carro Kei é essencialmente um carro para locomoção e nada mais.
O herói desse filme parece ter encontrado uma maneira bem simples de viver. Ele lê um livro por vez, toma banho numa casa de banhos, lava as roupas numa lavanderia, come no mesmo restaurante todos os dias. As coisas interessantes da vida dele chegam sem serem convidadas.
Num ponto o filme falha: as fitas cassetes não duram tanto tempo. Eu sei porque tenho algumas ainda. Depois de uns 20 anos, elas começam a estragar. E mesmo que sobrevivam, está quase impossível achar onde tocá-las.
Então, as minhas ressalvas à ideia do filme são duas:
Primeiro, manter o status quo exige energia. As mudanças vão nos empurrando de tal sorte que nem sempre vale a pena manter tudo parado.
Em segundo lugar, nem tudo merece ser preservado. As fitas cassetes serviram seu papel, mas hoje em dia elas são, junto com os LPs, lixo plástico. Um único pen-drive armazena milhares de discos e consome menos recursos por isso.
Então, o filme está a nos mostrar uma noção de vida mais simples, mas usa uma artimanha que esconde um desperdício bárbaro. A ideia é o que conta, eu sei, mas este é um blog sobre tecnologia. Continuar a usar fitas cassete em 2024 é como ter uma Mercedes de 1950: é muito bonito, mas exige tempo e recursos que não valem realmente a pena (para a maior parte das pessoas).
Hirayama, o personagem central do filme, usa câmeras com filme. Talvez em Tóquio ainda exista onde revelar filme, mas em cidades com menos de 30 milhões de habitantes, talvez seja difícil.
Em resumo, eu gostei da noção do filme de que devemos procurar uma maneira mais simples de viver. Vejo muitas pessoas sofrendo por quererem ter tudo ao mesmo tempo. Por outro lado, acho que o filme errou nos detalhes, porque usou artefatos que, embora nos remetam a tempos mais simples (ou seria apenas uma ilusão da nossa memória?), na realidade complicariam bastante a vida de quem quer usá-los ainda hoje. Eis a magia do cinema, sempre a nos iludir.
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