sábado, 11 de novembro de 2023

Presensocial

O escritório está a 5km de minha casa, mas entre levar as crianças ao colégio e dar carona à esposa, levo pelo menos uma hora para chegar lá. O trajeto todo tem uns 15km, então a velocidade média é de 15km/h. Péssimo.

Chego ao escritório cedo para ter tempo de verificar a situação antes que as interrupções iniciem. Dá tempo para resolver alguns chamados e talvez até corrigir um bug. Meia hora mais tarde, já começam a chegar pessoas assobiando pelo corredor. Alguém entra na sala para perguntar se o chefe está; alguém pede ajuda com a impressora ou com o wifi.

Uma vez que o escritório esteja cheio, começam as reuniões improvisadas, as reuniões remotas simultâneas, as ligações equivocadas, e uma miríade de interrupções, algumas até divertidas.

Trabalhar para valer, é difícil. Talvez dê para resolver algo à tarde.

O segredo da felicidade são as baixas expectativas. Não adianta sonhar em ser muito produtivo num cenário destes. Já vi piores: já trabalhei no meio de uma reforma, numa sala com 60 pessoas.

Penso que talvez essa ânsia pela volta ao trabalho presencial seja um conflito de gerações. As pessoas no topo da hierarquia costumam ser mais velhas; talvez os filhos já tenham crescido e talvez ficar em casa sozinho seja um pouco triste. Ou talvez o trabalho de quem gerencia seja essencialmente político e social. Quero crer que não seja por maldade, embora não seja, digamos, muito inteligente.

Os gringos já inventaram o termo coffee-badging. O sujeito vai ao escritório, bate o ponto, toma um café com os colegas, e volta para casa para trabalhar de verdade. Para mim, não seria uma solução, porque eu queria justamente evitar ter que ir ao escritório todos os dias. Uma vez ou duas por semana seriam suficientes.

Coffee-badging é um bom termo, mas eu queria algo mais próximo da nossa língua. Ocorreu-me "presensocial". Se falar rápido, o chefe nem vai perceber a ironia.

Evidentemente, menos resultados são produzidos. E eu certamente não vou chegar a casa depois de 2h no trânsito naquele dia para ligar o micro. Durante a pandemia, eu trabalhava muito mais que as minhas horas e consegui fazer muitas coisas boas.

Parece que a firma não está interessada no meu trabalho, mas na minha companhia. Acho que a firma precisa de apoio psicológico.

Um comentário:

  1. Como bom "trabalhador remoto" (já fazia isso por um pouco mais de 5 anos quano COVID apareceu), eu vou raramente ao escritório. As ocasiões em que o faço, não é para trabalhar, no sentido usual da palavra: esses dias (1x mês geralmente) são para circular pelas mesas e café para conversar com as pessoas, até porque o ambiente é barulhento demais para meu gosto, não consigo me concentrar com tanto ruído e interrupções.

    Ah, exceto no início da manhã: também cego cedo, super-cedo na verdade, como estratégia para fugir do trânsito de uma certa via federal, e isso me dá umas duas horas de foco e concentração ;-) Mas a contrapartida disso é que saio cedo também, lá pelo meio da tarde, pelo mesmo motivo que me move pela manhã.

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